Amor Sapeca Pelo Animal de Estimação

 Texto escrito por: Letícia Nunes

(Foto retirada do google)


O rangido da porta ao se abrir denuncia o crime. O meliante entra no box do banheiro em busca de água. Ele tem nome de gente, mas se trata apenas do meu cachorrinho de estimação, Isabello. 

Poodle número um, nove anos e pelos brancos cacheados. Signo de libra, charmoso e fofo. Ascendente em peixes, carinhoso e manhoso. Lua em touro, preguiçoso, guloso e dorminhoco.

Isabello sempre foi muito educado e obediente, mas tem uma mania que eu não consigo tirar. Não importa se tem um copo de água limpo em cada canto da casa, ele sempre vai dar preferência aos resquícios de água ensaboada do chão do box do banheiro. 

Em minha defesa, logo vos digo, não é culpa minha! Sempre me certifico de secar bem o box após o banho, porém vai tentar convencer meu irmão de fazer o mesmo...

Assim que me dou conta das intenções dele, trato logo de chamar seu nome da cozinha em tom de repreensão. Não obtenho resposta e o chamo de novo. Nada. Na terceira vez em que sou ignorada, desisto e me direciono até a cena do crime, pegando-o em flagrante.

- Vem aqui! – Digo mandona, reforçando a ordem ao apontar para o chão.

Ele fica parado, me olhando com ar desconfiado. Seu jeito atrapalhado e acanhado ao se aproximar de mim me rouba um sorriso. Ele se dá conta da minha reação positiva e começa a latir animado. Faço carinho atrás de suas orelhas e ele se empolga. Rodopia duas vezes e late mais alto. Pego-o no colo e dou-lhe vários beijos, levando-o para tomar água no lugar certo.

- Você não aprende mesmo... – Falo alto para mim mesma.

Isabello me ignora, matando a sua sede como se nada tivesse acontecido. Quando termina, faz charminho pedindo mais carinho.

- Você me ama? – Pergunto para ele.

Isabello fica quieto olhando para mim, e não é como se eu precisasse de uma resposta. O amor entre nós está na cumplicidade de um falar alto e o outro compreendê-lo em silêncio. O amor entre nós está em um ser rebelde, quebrando as regras ao tomar água do box do banheiro, fazendo xixi nos lugares proibidos, e do outro reclamar, mesmo sabendo que não vai adiantar de nada. 

O nosso amor está nessa brincadeira em mantê-lo simples. 

Mas, apesar de simples, nosso amor um pelo outro é puro. Certa vez, em um domingo ensolarado, acordei cedo e fui diretamente dar ‘Bom dia’ a Isabello. Geralmente, ele faz a maior festa. No entanto, nesse dia em especial, ele apenas se aproximou e ficou quietinho.

Eu estava sonolenta ainda, e apenas dei o carinho que ele pediu. Preparei meu café conversando mil aleatoriedades com Isabello, tratando-o como gente. Ele apenas escutou, encolhido no canto.

Após tomar meu café chamei-o para perto. Ele não veio. Chamei-o de novo e ele se manteve no mesmo lugar. Vendo-o daquela forma comecei a me dar conta de que algo estava errado. Me aproximei de Isabello e tentei colocá-lo no colo, e ele choramingou.

Fim de linha para mim.

No primeiro momento, apenas percebi que ele estava com dor, mas para descobrir onde era doía realmente foi necessário ‘cutucá-lo’ de leve em vários lugres. Descobri por fim que era na patinha.

Nunca fiquei tão preocupada na vida.

Era domingo de quarentena, e eu apenas pensava que deveria resolver a dor de Isabello de algum jeito logo. Então, recorri ao Google.

Nem lembro o que coloquei na caixa de pesquisa, só sei que por felicidade encontrei um site que descrevia exatamente os sintomas que detectei nele. Ao que parecia, era um tipo de ‘cãibra’ de uma noite mal dormida. Algumas das recomendações eram: Levar ao veterinário e massagear o local levemente.

Em um ato impensado, segui a segunda opção.

Fiquei ali ao lado de Isabello por um bom tempo ‘massageando’ a pata dolorida. Fiquei comovida ao vê-lo tão quieto sob minhas mãos por medo de sentir dor. Ele se manteve assim pelo resto do dia, e volta e meia, eu ficava ao lado dele, fazendo massagens.

Diante do meu comportamento, minha mãe pegou uma toalha de mesa e improvisou uma tipoia na pata dele. Inicialmente eu ri, mas tive que confessar que minha mãe tinha feito um ótimo trabalho na improvisação. 

Passamos a manhã e um período da tarde com a atenção voltada a Isabello. No fim das contas, tudo terminou bem. Isabello melhorou, fosse pela massagem, fosse pela tipoia, fosse pelo amor e atenção que recebeu. 

Por isso, quando vi a notícia de que uma mãe de pet tingiu sem querer seu gato de amarelo na tentativa de curá-lo de uma micose com açafrão não julguei, porque, por um lado compreendo que pelo amor sapeca somos capazes de tudo.

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